Uma divisão proposital ou inconsciente?



Pedro César Batista

A burguesia nacional, verdadeiros capachos do imperialismo, sustenta o governo Bolsonaro, preocupada em preservar seus interesses e privilégios. Por outro lado, as forças que deveriam criar as condições subjetivas para alterar a correlação de forças nada fazem. Considerando que as condições objetivas se desenvolvem rapidamente.

Em 20 meses de governo, Bolsonaro aprofundou a crise econômica, a pandemia somente reforçou sua política contra a classe trabalhadora. Ele praticou inúmeros crimes de responsabilidade e comuns, que cassariam qualquer governante em um país com as estruturas jurídicas minimamente fortes e coerentes com o que se denominou Estado Democrático de Direito. Sem falar dos crimes eleitorais que praticou durante a campanha eleitoral, que vão desde a farsa da Lava Jato, uma ação pensada, organizada e financiada pelos EUA, que praticou o arbítrio, colocando na cadeia o candidato com mais possibilidades de vitória eleitoral, falsificando um processo, sustentado por uma poderosa campanha midiática repleta em informação falsa, pavimentando a vitória do miliciano fascista para a Presidência da República.

Apesar de tantos crimes, com mais de 30 pedidos de afastamento na Câmara dos Deputados, oito processos no TSE e ações de crimes comuns no STF, as forças que poderiam alterar a correlação de forças seguem dispersas, sem criarem as condições para alterar a realidade, assim permitindo que Bolsonaro e seu governo siga com o desmonte do estado brasileiro, a retirada dos direitos sociais e prossiga o genocídio em curso, que já matou mais de 92 mil pessoas devido a covid-19.

A quem interessa não forjar a unidade para criar as condições que poderiam levar a cassação do governo inimigo do povo brasileiro e da vida e lacaio do grande capital? A desconstrução da experiência do Comitê Popular Fora Bolsonaro, em Brasília, merece ser devidamente analisada, utilizando-se como um caso para compreender a conjuntura atual.

O Comitê Popular Fora Bolsonaro - CPFB, criado no final de novembro de 2019, aglutinou militantes do PT, PCdoB, PSOL, dirigentes de sindicatos, de movimentos e ativistas que não integram nenhuma organização, além das direções do PCO e UP. O seu lançamento foi significativo, com expressiva participação da militância da FNL, principalmente. Veio a pandemia, com isso as ações se desmobilizaram, principalmente em 31 de março, ato que marcaria os 56 anos da ditadura de 64. As atividades seguiram virtuais, até que se organizaram alguns atos presenciais, tomando-se o cuidado com distanciamento, uso de máscara e aplicação de álcool gel. O primeiro foi na Praça dos Três Poderes, conseguiu um bom espaço na grande imprensa, pela unidade e importância que mostrou. Em seguida ocorreram mais dois em frente ao TSE. Em um deles, quando foram julgadas duas ações impetradas durante a campanha eleitoral, uma pelo PSOL e a outra pela REDE. A REDE mandou representação da direção nacional ao ato.

Neste período, começou o racha na campanha Fora Bolsonaro, após uma divergência em São Paulo, quanto as negociações com a polícia paulista sobre o local onde se realizaria o ato. As torcidas organizadas estavam ocupando as ruas com a palavra de ordem “Democracia”, sem reforçar o Fora Bolsonaro. Realizaram atos mais expressivos em São Paulo e Brasília, além de outras cidades. Foi quando o PCO, por meio de seu diário acusa Guilherme Boulos, dirigente do MTST e do PSOL, de dividir o movimento, chamando-o de “quinta coluna”. Estes ataques a Boulos cresceram, isso fez com que os militantes do PSOL se afastassem definitivamente do CPFB.

Ao mesmo tempo, começaram a pipocar atos de grupos do PT, principalmente na Capital Federal. O PCO também continuou chamando manifestações, cada um isoladamente. Por outro lado, as Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, criadas durante o processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff, passaram a realizar reuniões nacionais e chamar atividades, sempre virtuais. Também começaram os panelaços, convocados por várias correntes, desde as Janelas Pela Democracia, organizadas pela REDE, PDT, PSB e PV, até a UP, o PT e as centrais sindicais. Não havia unidade nem para a construção dos panelaços.

Se o governo Bolsonaro/Mourão serve aos interesses do grande capital, com uma política que atende somente os bancos e seus parceiros, tendo como base setores militares e neopentecostais, com a grande imprensa reforçando o projeto neoliberal, comandado por Guedes, que entrega o patrimônio nacional aos seus chefes imperialistas, onde estão as forças que se dizem ao lado da classe trabalhadora, que deveriam criar as condições necessárias para organizar e unir as forças populares e de esquerda, o único caminho para derrotar os crimes que o governo executa?

A burguesia e o imperialismo sempre fomentaram a divisão da classe trabalhadora, cooptam lideranças e governos, realizam golpes, massacres e guerras, usam muito dinheiro para financiar movimentos que atuam contra a unidade da classe trabalhadora e propagam o divisionismo e a desagregação. Movimentos que tem como bandeira a defesa e busca da manutenção do status quo individual e de alguns segmentos. A política que reforça as lutas identitárias nega a importância e a necessidade da unidade revolucionária da classe trabalhadora enquanto classe social, negando a necessidade da luta de classes. Esta divisão contribui para que os mais ricos sigam acumulando mais riquezas, como comprovam os números divulgados que mostram os bilionários aumentando suas fortunas durante a pandemia.

No decorrer do processo golpista que afastou a presidente Dilma Rousseff, alguns setores de esquerda afirmaram que haveria uma guerra civil no Brasil se conseguissem o intento. Foi dado o golpe, prenderam Lula, elegeram um sicário para a presidência e não teve guerra civil. Entretanto, estes mesmos setores, seguem com sua política exclusivista, buscam hegemonia, negam-se a atuar junto com outros movimentos que não se alinham com suas políticas ou se sujeitam a serem liderados por eles. No lugar de se construir e organizar unidade para derrotar o principal e grande inimigo do povo e da classe trabalhadora brasileira, para alguns, a prioridade é a hegemonia.

Ao mesmo tempo, o Brasil rapidamente, como em uma disputa para ver quem terá mais mortes, aproxima-se de 100 mil mortos pela covid-19. Bolsonaro e seu governo se vangloria, faz piadas e propaga remédios sem base científica, avança com suas milícias, agora reforçadas pelas polícias estatais, em seus crimes, que vão desde a destruição do patrimônio nacional, da estrutura jurídica do Estado social-liberal, criado com a Constituição de 1988, até o incentivo do genocídio em curso, que reduzirá a pressão social, como afirmou uma dirigente do Ministério da Economia.

Com tudo isso acontecendo, as lideranças da esquerda brasileira preocupam-se com o aumento de seus quadros, a eleição que se aproxima e a busca da hegemonia. A desarticulação do CPFB foi um experimento de desconstrução executada por quem deveria atuar para forjar unidade e luta contra o principal inimigo do povo brasileiro. Ações isoladas contra os crimes da Lava – Jato, do governo Bolsonaro e o genocídio em curso crescem, mas não vão alterar a correlação de forças entre a classe trabalhadora e a burguesia nacional a serviço do grande capital internacional se não estiverem articuladas e fazerem parte de uma organização que congregue todas as ações e forças em uma mesma direção.

Finalizo com a seguinte questão, se essas práticas desenvolvidas por diversos setores da esquerda brasileira, que tem unicamente como estratégia a busca da hegemonia, provocando a fragmentação de quem poderia derrotar o governo fascista é proposital e consciente ou não. Acredito, porém, caso as forças da esquerda sigam com ações isoladas, em sua maioria virtuais ou institucionais, buscando exclusivismo ou se considerando os únicos capazes de mudar a realidade, o que acaba fomentando a divisão, o resultado será muito pior e tão criminoso quanto os crimes da burguesia, que aplica o fascismo para sustentar sua política neoliberal. A história mostrará se esta prática oportunista, demagógica e divisionista é consciente ou apenas um equívoco. O tempo exige uma alteração na rota, a obrigação é derrotar o governo Bolsonaro e criar as condições para avançar nas lutas históricas da classe trabalhadora.

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