Todos não são iguais

Gregório Ega



Quem diz que todos os políticos são iguais precisa usar um pouco o raciocínio. Usar o cérebro não cansa, ajuda a desenvolver o intelecto e permite ampliar os horizontes na vida cotidiana.

Nada é igual, menos ainda os políticos. Vejamos. Têm aqueles que foram eleitos com apoio ostensivo de latifundiários (fazendeiros proprietários de grandes áreas rurais). Para se ter uma ideia 42% das áreas agrícolas do Brasil, o equivalente a 242.795.142 hectares, estão nas mãos de 0,8% de proprietários (39.250 famílias). Na outra situação, aqueles que têm pouca terra, representam 1,4% de todas as terras (até 10 hectares), reunindo 33,7% de proprietários (8.215.337). Usando o cérebro, vejamos, menos de 1% de proprietários, de um total de mais de 570 milhões de hectares, tem 42% das áreas de todo o país. Enquanto há dezenas de milhares acampados nas beiras de estradas lutando por um pedaço de terra. Vejamos.

A política reflete a organização da sociedade. Quais os setores mais organizados?

O governo de Temer, congelou por 20 anos o orçamento para as políticas sociais, a chamada PEC do Fim do Mundo. Ficou sabendo disso? Pois. Não saiu assim na Globo. Lá disseram que era para controlar os gastos públicos. Fizeram uma reforma trabalhista. Deram ao patrão o poder de fazer “acordo” com o emprego, independente da lei, que deixou de valer em caso de “acordo”. Significa, se o patrão oferecer determinadas condições, o trabalhador não poderá alterar, nem recorrer ao sindicato. Se não concordar, tem uma multidão de desempregados em busca de um trabalho. Acabaram com o Ministério do Trabalho. O capitão agora disse que quer acabar com a Justiça do Trabalho. Também dizem que a reforma da previdência é necessária. Que falta dinheiro. Ao mesmo tempo, os bancos recebem diariamente, a título de pagamento dos juros da dívida pública, mais de 2 bilhões de reais. Entendeu. Diariamente mais de 2 bilhões de reais. Por ano chega a aproximadamente 1 trilhão de reais. Nestes primeiros dias de um novo velho governo, o capitão disse que perdoará 17 bilhões de reais de dívidas dos fazendeiros. Sim aqueles que detêm mais de 42% das terras e representam 0,8% dos proprietários.

Dá para pensar um pouco.

Veja. Não tem dinheiro para aumentar 8 reais o salário mínimo, a saúde público enfrenta o sucateamento do SUS, as escolas públicas sendo desmontadas, os trabalhadores não podem ter direitos, se quiserem ter empregos, sem esquecer que tem que fazer a reforma da previdência. Mas paga diariamente mais de 2 bilhões aos banqueiros e perdoa 17 bilhões dos fazendeiros.

Quem garante que isto ocorra? Quem decide o que ser feito? Quem decide a vida das pessoas? São os políticos. E quem são a maioria dos políticos (vereadores, deputados e senadores)? Quem eles representam?

Quem são os políticos contra a reforma trabalhista, contra o congelamento dos recursos públicos para as politicas sociais, contra a concentração da terra e contra o pagamento de juros da dívida pública? Quem são? Existem? Sim. São aqueles que estão nas ruas enfrentando a polícia, no parlamento enfrentando as mentiras da Globo. Infelizmente são poucos, mas eles existem e estão na luta.

Agora vejamos outra questão.

Será que a vida de cada pessoa depende de fato dela? Vejamos um exemplo. O filho do novo vice-presidente, gen. Mourão. O rapaz trabalha há 20 anos no Banco do Brasil e foi promovido para uma assessoria da Presidência do Banco, com salário mensal de aproximadamente 40 mil reais, mais um bônus, a cada dois anos, de dois milhões de reais. Será que qualquer funcionário do BB teria esta oportunidade?

Vamos ver mais.

Uma criança, que desde cedo se alimenta bem, estuda em boas escolas, com acesso as artes, esportes e todas as oportunidades, tornando-se, ainda adolescente, um estudante universitário. Esta mesma pessoa, antes dos 30, terá feito mestrado e terá o título de Doutor, tendo viajado por vários países e falando vários idiomas.

Na outra ponta, aquela criança, que não tem o pai latifundiário, nem proprietário de grandes indústrias ou bancos ou mesmo filha de general, um vice-presidente da República, como será a sua vida? Na infância sofrerá todas as dificuldades junto com seus pais para se alimentarem, vestirem-se, cuidar da saúde. Estudará em escolas sucateadas, com professores, apesar de dedicados, com baixos salários e sem recursos para ensinar. Quando adoecer enfrentará todas as dificuldades para ter acesso a um médico na rede pública. Cedo começará a trabalhar, em um subemprego, para ajudar no orçamento familiar. O acesso a faculdade, foi facilitado durante um recente período, conforme os dados mostram, mas na realidade, a maioria seguirá como mãos de obra sem qualificação. Não fará um curso superior ou mestrado ou doutorado. Será um peão, no linguajar do filho do patrão. Sua escola será o dia a dia da vida.

Você acha que os dois, o filho nascido em “berço de ouro” e o filho de operários desempregados ou que vivem em subempregos terão as mesmas condições para disputar empregos ou espaços na sociedade? Um será subalterno. Outro, será patrão. Um será explorado; outro, explorador. Entretanto, o mais cruel, é que fazem os filhos da classe trabalhadora acreditar que serão patrão, que tudo dependerá do seu esforço, do seu mérito e sua capacidade individual para “vencer” na vida.

E o Estado?

A criação do Estado - o poder jurídico, policial e político, teve a finalidade de normatizar as relações entre as classes sociais. Assegurar que a classe mais poderosa política e econômica controlasse a classe mais frágil, sem forças política e econômica. O exército, a polícia e a justiça têm a finalidade de garantir que os privilegiados, detentores das riquezas (produzidas pelos operários e camponeses) permaneçam nas mãos dos mesmos de sempre. Para isso, usam a escola, a mídia, a indústria cultural (televisão, novelas, propaganda, música, etc) e todos os instrumentos que transmitem conhecimentos e valores culturais e morais. Uns são educados para seguir comandando; outros, a grande maioria, segue sendo preparada de todas as formas para continuar subalterna, até mesmo nos sonhos, pois o máximo que permitem é que reproduzam os sonhos que os patrões lhes passam. E, quando alguns ousam desafiar este poder, eles são cruéis. Primeiro, tentam cooptar, oferecendo migalhas, fardas, ilusões, transformando os pobres em “cachorros” dos ricos. Quem não se vende, propagam calúnias, usam a televisão, igreja, escolas e todos os meios para que os pobres e explorados tenham raiva e ódio contra a política, levando-os a acreditar que aqueles que o defendem são iguais aos demais, ou mesmo piores, pois conseguem, com seus meios, mesmo quando os matam, fazê-los serem os criadores de problemas, inimigos da família, de Deus, da pátria. “Água mole tanto bate até que fura”, entrando nas consciências dos de baixo. Inventam todas as estórias, levando as pessoas sem capacidade crítica e o devido conhecimento histórico a repetirem o que é propagado. Muitas vezes na forma de dogma, algo sagrado, inquestionável. E, por fim, quem de fato está ao lado dos que mais precisam são tornados inimigos destes. Dizem os mais necessitados, todos são iguais, a vida depende de mim, de mais ninguém. Significa que o necessitado foi totalmente cooptado pela ideia propagada pelo poderoso.

É possível mudar isso?

No passado foi muito pior. No Brasil, por 388 anos a escravidão foi legal, sustentada pela igreja e pelos que acumularam muita riqueza ao longo destes séculos. O escravo era obrigado a produzir 16 horas por dia, sendo seviciado, humilhado e usado apenas como uma ferramenta de trabalho. A expectativa de vida de um negro, no século XVII, era de 27 anos. O mundo mudou, mas a exploração adquiriu novas roupagens. No início do Sec. XX, colonos e operários em muitos países, e no Brasil, organizaram-se e passaram a enfrentar a exploração do patronato e conseguiram conquistar muitos direitos. Conquistou-se a jornada diária de 8 horas de trabalho, o direito de voto das mulheres, o direito de fazer greve e de possuir organização sindical, entre muitas lutas desenvolvidas, o que trouxe consciência de classe aos que produziam riquezas, com suor e sangue. O socialismo resistiu por 73 anos na antiga União Soviética, mostrando que os trabalhadores eram capazes de dirigir e fazer um Estado a seu serviço. Ocorreu a segunda guerra mundial, quando a URSS derrotou o nazismo, mas, no início dos anos 90, a primeira experiência dos trabalhadores terminou derrocada. O povo foi traído. Como tem sido comum na história da humanidade. Outros povos seguem ousando ter um modelo de Estado que sirva à maioria, a classe trabalhadora e enfrentando as ameaças políticas, bloqueios econômicos e as mentiras propagadas pela imprensa porta voz dos grandes capitalistas.

As lutas por justiça, por direitos e pela emancipação humana nunca recuou. Sempre, desde os primeiros registros da história, com Espártacus, que enfrentou o Império Romano, até os dias de hoje, com os sem-terras, os sem tetos, os trabalhadores urbanos e setores populares seguem combatendo por seus direitos e justiça, enfrentando calúnias e a violência dos poderosos. Nunca foi diferente. Nem será diferente.

Uma contribuição para estudo e debate.

Espero que tenha ajudado em seu raciocínio. Perceba. Ninguém é igual, menos ainda na política. Tudo se transforma, muda, e as classes mais necessitadas sempre enfrentaram a violência, as mentiras e o poder dos capitalistas, mas venceram. As oportunidades, para serem minimamente iguais precisa-se de um Estado que esteja a serviço da maioria, não dos poderosos latifundiários, banqueiros e outros ricos, graças à exploração do povo. Construir um novo Estado, onde haja justiça, igualdade e oportunidade para quem mais necessita exige que as classes produtoras, do campo e da cidade, as camadas populares e todos os setores que vivam do seu trabalho, manual ou intelectual, organizem-se, lutem e ousem enfrentar as mentiras e a violência dos poderosos.

Entretanto, se mesmo sabendo de tudo isso, você continua afirmando que todos os políticos são iguais e que tudo dependerá de seu esforço e de seu mérito, que você que precisa de um patrão e não o contrário, saiba, você repete o que os opressores, exploradores e cínicos capitalistas colocaram em sua cabeça. Você, operário, camponês ou qualquer pessoa que viva de seu suor, do seu sangue e seus esforços repetir isso saiba, és um ventríloquo do teu algoz.

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