O que não fazer?



Por Pedro César Batista


Lenin, em sua genialidade revolucionária, publicou, em 1902, a obra O que fazer ?[1], na qual aponta as contradições entre aqueles que lutavam para construir o partido revolucionário e os que priorizavam as lutas econômicas. Sustentou, em seu trabalho, que o espontaneísmo e a não elaboração de tática e estratégia para o trabalho da organização revolucionária terminava por servir aos interesses contrários aos dos trabalhadores, ao do proletariado e o das camadas populares. Denunciou o discurso manipulador de que na democracia não existia mais a luta de classes: “Estamos rodeados por todas as partes de inimigos, e teremos que marchar quase sempre sob seu fogo”[2]. Suas palavras parecem ter sido escritas nos dias atuais, quando falar em revolução e na construção da sociedade comunista, para muitos, pode ser considerado uma alucinação ou loucura. Lenin destacou ainda a importância e o papel de um jornal na organização coletiva, ajudando a propagar as ideias e conceitos para a luta popular e revolucionária.

Passaram-se mais de cem anos desde a publicação de O que fazer?, - texto atual e que merece ser relido. No limiar do século XXI, com o surgimento de novas categorias produtivas, o capitalismo, em sua fase mais desenvolvida, tem conseguido enraizar seus fundamentos na alma da população. Justificando-se uma concentração de riquezas em nível planetário a um nível tão elevado, cruel e criminoso, com as 85 pessoas mais ricas do planeta detendo um patrimônio equivalente as que possuem 3,5 bilhões de habitantes[3], justamente os mais pobres, ou seja, a metade da população do planeta[4]. Esse controle é assegurado através de um grupo de 10 empresas que controlam mais de 90% das marcas de produtos consumidos em todos os países[5], muitas de origem sionista, financiando a propagação das verdades dos vencedores.

Essa fase imperialista, como antes não se tinha visto na história da humanidade, confirma a previsão, feita por Marx, da formação de monopólios, o aumento da exploração do trabalho e da acumulação da mais valia[6]. Logo antes da Revolução de Outubro, em julho de 1916, Lenin escreveu apontando o imperialismo como a fase superior do capitalismo[7], que seria a fusão do capital financeiro com o industrial e, trazendo para os tempos atuais, também o agrícola, com a formação de grupos econômicos que dividiriam o mundo conforme seus interesses. Lenin apontou que nessa fase o capital financeiro adquiriria uma importância de primeira ordem, o que se verificamos nos dias atuais. Diante desse quadro que propaga o consumo e o mercado como deuses onipresentes e invencíveis, por todos os continentes existem organizações e grupos de resistência, que combatem e lutam contra o poder do capital e a sua imposição ideológica, econômica e militar, o qual usa todos os meios, abertos ou subliminares, para manipular e cooptar organizações e militantes da luta pela emancipação humana. Existem setores, organizações e pessoas que mudaram de lado, traindo as camadas populares e a luta das classes trabalhadoras, passando a servir aos senhores donos do capital. Por isso, ao escrever O que não fazer? faço o contraponto com a atualidade ao escrito por Lenin, com a finalidade de contribuir para o debate que busca  apontar os caminhos para atender a necessidade histórica da construção de uma frente das forças populares e revolucionárias, sustentadas e orientando-se por um programa mínimo de lutas, que permita criar às condições para reforçar a bandeira da dignidade e da emancipação humana, capaz de superar o conformismo, o oportunismo e a negação histórica da luta, propagada pelos donos do capital e seus serviçais.

A luta dos trabalhadores e das camadas populares em todo o mundo enfrenta muitas dificuldades, especialmente no Brasil, quando se vê o ascenso de forças fascistas e reacionárias, sustentadas pelo raivoso e reacionário discurso que usam os equívocos de alguns setores da esquerda, que abandonaram a frente de batalha depois de chegar ao governo, burocratizando-se e se aliando a setores conservadores, em nome de uma governabilidade que em nada alterou as estruturas do país, assim como, sustentando e desenvolvendo velhas práticas fisiológicas da direita e oligarquias. Em O que não fazer? relaciono alguns tópicos necessários para retomar a formação, a militância e a luta popular, contribuindo para reforçar a caminhada, voltando a mobilizar e sensibilizar a classe trabalhadora e as camadas populares em torno do ideal revolucionário e comunista.


1 – Seguir divididos, desunidos e dispersos.
Os lutadores do povo e os revolucionários não devem seguir dispersos, desunidos e pulverizados em diversas organizações, conforme os segmentos produtivos, prestadores de serviços ou intelectuais , com cada um atuando de forma isolada e desarticulado um como o outro.

As camadas populares e as classes trabalhadoras não detêm a propriedade dos meios de produção, o controle do sistema financeiro ou do aparelho de Estado, que são usados como instrumentos para aumentar a concentração das riquezas nas mãos dos detentores das fábricas, terras, bancos e meios de comunicação. Como pagamento do trabalho ou serviço realizado os trabalhadores recebem um salário que não corresponde ao bem ou riqueza produzida, assim como não satisfaz as suas obrigações e de seus familiares. Mesmo assim, acabam presos aos patrões e ao governo, pois precisa assegurar a satisfação de suas necessidades, levando muitos a considerarem o capitalista um benfeitor. Isso ocorre devido o trabalhador não possuir uma consciência de classe, crítica ou revolucionária. Têm uma consciência ingênua que o leva a achar essa relação de exploração da mão de obra e concentração natural. Essa falta de consciência de classe termina por provocar divisões no seio popular e causa o conformismo diante da realidade enfrentada. Esses fatores acabam por levar a cooptação de lideranças populares e de trabalhadores pelos burgueses.

Para provocar essa divisão no meio popular e na classe trabalhadora, os detentores dos meios de produção e controladores do Estado aplicam os mais variados instrumentos, sendo que a comunicação de massa é uma das principais, que se consolidam com a ideologia propagada dentro das escolas, igrejas e de forma generalizada em toda a sociedade, com uma massiva e forte campanha ideológica, travestida com os nomes de democracia, liberdade e individualidade. Esse discurso atinge todos os segmentos, dentro da diversidade das camadas populares e das classes trabalhadoras, que passam a atuar de forma exclusiva, não compreendendo, nem se atentando a necessidade de união da classe trabalhadora, como proprietários exclusivos de sua capacidade manual ou intelectual para a produção de riquezas.

Outras questões merecem ser levadas em consideração, como às questões de gênero, raça, orientação sexual e o conjunto da diversidade existente na sociedade, as quais, mesmo sendo importantes, devem ser analisadas a partir de uma visão como parte integrante das lutas entre as classes majoritárias, de um lado os proprietários dos meios de produção e do capital e do outro os que vivem de seu trabalho. Por isso, estas questões precisam ser analisadas como parte da luta maior das camadas populares e das classes trabalhadoras, estando em primeiro lugar o combate ao sistema capitalista, o verdadeiro responsável pela violência com as minorias e setores marginalizados e oprimidos.

Uma mulher moradora da periferia, desempregada, negra e feminista, mesmo em pleno século XXI, não tem as mesmas oportunidades e direitos que uma mulher moradora de bairros nobres, abastada, negra e feminista. O machismo, mesmo atentando contra os direitos de todas as mulheres, em todas as classes, tem a sua prevalência nas camadas mais populares, em que as mulheres, além de terem dupla ou tripla jornada de trabalho, sofrem toda a carga da opressão do capitalismo.
Uma pessoa homossexual e residente na periferia não tem as mesmas oportunidades que uma pessoa homossexual, proprietária de bens e residente em bairros nobres. A relação entre as pessoas, dentro da sociedade, e entre a sociedade e os governos, e entre a sociedade e o governo versus o Estado nunca foram, nem serão iguais ou as mesmas para todas as pessoas. Os mais pobres, desempregados, negros, as camadas populares e os trabalhadores sempre sofrerão a violência da falta da garantia de seus direitos, enquanto a minoria, privilegiada e rica, não enfrentará esses problemas.

Os detentores de capital, renda ou bens sempre foram privilegiados, enquanto os pobres e os que se sustentam de seu trabalho ou serviço sempre foram e serão marginalizados. Claro, isso enquanto existir a sociedade de classes, a sociedade capitalista, com um Estado opressor a serviço dos poderosos. Não há meio termo, são duas classes sociais, as quais têm internamente suas diversidades, origens variadas, sustentam-se de forma distinta, porém não há conciliação, cada qual tem seus interesses estratégicos distintos e antagônicos. Os mais humildes são o sustentáculo dos que vivem nas classes abastadas, ricas e privilegiadas.

Por isso, considero que a primeira necessidade a nortear os passos e análises dos que buscam uma sociedade nova, diferente, justa, solidária e fraterna é não repetir que não exista mais classes ou lutas de classes. Pelo contrário, basta ver a pele de uma jovem moradora da periferia e a de uma jovem filha da burguesia, as vestimentas, onde estuda e sua alimentação; em tudo haverá distinção. E isso se repete na vida dos garotos, dos pais, das mães, no dia-a-dia, no futuro e na vida de cada indivíduo da sociedade.

As classes abastadas inventaram uma série de argumentos e conceitos, todos, em grande parte reproduzida pelos trabalhadores, mas são essencialmente conceitos para amortecer, enganar, ludibriar e, principalmente, dividir as camadas populares e as classes trabalhadoras para que não fortaleçam a sua luta. A frase final do Manifesto Comunista[8] permanece atualíssima, assim como se fosse um dia quente no verão: trabalhadores de todo o mundo, uni-vos!


2 – Negar a importância da política na vida da sociedade.
Negar a importância da política é como dar um tiro no pé. A política é o instrumento de análise e interpretação das relações sociais, refletindo-se nas lutas de classe, por isso é fundamental, pois a partir da decisão e ação política todas as decisões, relacionadas ao indivíduo, grupos sociais e a sociedade, são tomadas, definindo como funcionará a relação entre as classes dentro da sociedade. Para que as camadas populares e as classes produtoras se desinteressem da política as classes abastadas, controladoras e detentoras dos meios de produção e dos veículos de comunicação realizam cotidianamente uma subliminar, e muitas vezes direta, campanha contra a importância da política, da participação social, dos partidos e dos políticos. Propagam que nada muda na história, e quando ocorre alguma mudança sempre colocam como um presente, uma concessão de algum ilustre senhor, que de bom coração, age para agradar aos mais pobres. Propagam que a ação política não interessa, servindo para sustentar corruptos e ladrões – o que não é novo nem deixa de ser verdade, porém os ladrões e corruptos se tornam serviçais dos poderosos proprietários de riquezas, que seguem fazendo política, possuindo seus partidos, formando seus quadros de dirigentes políticos e, muitas vezes, cooptando ex-militantes das lutas dos trabalhadores e das camadas populares. Estes políticos corruptos, como afirmou Bertold Brecht[9] em seu poema O Analfabeto político, são os principais responsáveis por manter o sistema, atender os interesses dos capitalistas e causar as injustiças sociais e a miséria – em todas as suas formas - na sociedade.

Para mudar a sociedade, pressionar os governos, construir programas de governo, transformar o Estado e fazer a revolução há a política, sendo que quando esta não mais cumpre seu papel, surge o terror, seja do Estado ou de setores das camadas populares.

Para evitar que se siga uma política danosa aos interesses das camadas populares e das classes trabalhadoras estas necessitam – necessitam – fazer política, formar-se politicamente, estudar política, organizar e lutar politicamente para mudar os rumos da história e se tornar responsável pelo seu destino.

Na política não pode haver ilusão, não pode haver tergiversação quanto à defesa dos interesses defendidos, por isso, somente por isso, os setores de proprietários seguem fazendo e controlando a política, enquanto propagam que a política, os partidos e os políticos não prestam. Para isso, estes preservam um estado opressor, com uma polícia assassina, que diariamente mata o povo, principalmente os mais jovens, negros e pobres.

Para enfrentar a luta política as camadas populares e as classes trabalhadoras precisam se apropriar da política, organizar seus grupos, forjar sua unidade, elaborar um programa mínimo, construir sua unidade e não vacilar no combate ao poder dos poderosos.

3 – Esquecer as lutas travadas pelo povo do passado
Nunca devemos esquecer a história das lutas e as conquistas das classes trabalhadoras e camadas populares.

No mundo atual propaga-se de maneira muito forte um pensamento de que não importa o passado, nem o futuro, apenas o presente tem valor. Este pensamento é divulgado em escolas, igrejas, meios de comunicação e em rodas de conversas. Sua essência visa, entre outras questões, impedir que as camadas populares e as classes trabalhadoras conheçam o processo de desenvolvimento histórico da organização social. Ao longo de séculos, com a descoberta do fogo, passando pela fase do surgimento da propriedade, da criação do Estado, da invenção da indústria moderna, de todas as mudanças das estruturas econômicas, das diversas formas de governo e de gestão, possibilitaram evoluir nas relações e formas de produção, sem, entretanto, democratizar e socializar a distribuição e apropriação do resultado do trabalho. Toda a riqueza segue concentrada nas mãos dos detentores dos meios de produção e do capital financeiro, que também controlam os meios de comunicação e a informação que circula no mundo.

O processo de acumulação da riqueza, desde a sociedade escravagista até os dias atuais, com o alto grau de desenvolvimento tecnocientífico, tem sido de apropriação, cada vez mais sutil, do resultado do trabalho das classes trabalhadoras e camadas populares[10]. Sempre foi assim. A publicação do Manifesto Comunista, de Karl Marx e Engels[11], apontando a luta de classes e o processo histórico, identificando a mais valia - o roubo do trabalho não pago, a relação entre o trabalho e o capital, mostrando que a luta das classes produtoras de forma organizada tem possibilitado ao longo da história avançar nas conquistas de direitos e provocando a transformação social e revolucionária da sociedade, resultado do que foi denominado materialismo histórico e dialético[12], trazendo um novo olhar sobre a luta em defesa da emancipação humana.

Ao longo da história não faltam exemplos, desde Spartacus[13], as revoluções francesa e russa, a experiência da Comuna de Paris (março e abril de 1871), a guerra popular prolongada que levou a revolução chinesa (1946 – 1950), a resistência e vitória vietnamita contra a invasão dos EUA (1959 – 1975), a revolução cubana (1959), que em uma ilha, com todas as suas peculiaridades vem construindo um estado que se sustenta há 55 anos através da construção do poder popular. Há outras lutas também ocorridas no continente latino americano, como foi a organização dos negros fugitivos das Senzalas, tornando a experiência do Quilombo de Palmares (1585 – 1678), um dos marcos da luta pela liberdade, assim como foi a Cabanagem, no Pará (1835 – 1840), a Balaiada, no Maranhão (1838 – 1841), a Confederação do Equador, no nordeste (1824), o Cangaço (fim do século XIX – 1940), a Coluna Prestes (1925 – 1927), as Ligas Camponesas (1954 – 1964) e mais recentemente as lutas organizadas pelo MST, no campo, e pelo MTST, nos centros urbanos. É preciso recordar também a vitória eleitoral da Unidade Popular, no Chile (1970 – 1973), com Salvador Allende, em 1970, depois assassinado durante o golpe, organizado pela CIA/EUA, três anos depois, que matou mais de 30 mil chilenos; a vitória da Frente Sandinista de Libertação Nacional (1979), na Nicarágua, que está novamente no governo, através do processo eleitoral. Sem falar da resistência armada das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – FARC (fundada em 1964 e até hoje em luta) e do Exército de Libertação Nacional – ELN (criada em 1965 em ainda em combate), também neste país amazônico. E na atualidade as experiências desenvolvidas na Venezuela, na Bolívia e no Equador, após vitórias eleitorais. Mesmo com tantas experiências de lutas e conquistas não podemos esquecer o que os colonizadores fizeram durante a ocupação da América, da África e na Ásia, os milhões de mortos nas câmaras de gás, durante a segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), assassinados pelos nazifascistas, comandados por Hitler. Há ainda os milhares de mortos no Cone Sul, incluindo no Brasil, durante as ditaduras que infestaram nossa região, todas financiadas e organizadas pelos EUA.

A história é um processo em permanente mudança, resultado dos confrontos, onde as classes mais fortes, por serem mais organizadas, detentoras das riquezas e possuírem poderosos exércitos, têm, na maioria das vezes, especialmente no imaginário dos povos, conseguido derrotar o ideal da justiça, da liberdade e do socialismo, tornando hegemônicos os valores do individualismo, do consumo e do imediatismo, impedindo que se entenda o desenvolvimento da história da humanidade como resultado das lutas e conquistas dos trabalhadores e camadas populares.

Todas as conquistas sociais, econômicas e políticas foram frutos das lutas dos interessados, os excluídos, explorados e marginalizados: os direitos sociais e políticos, a jornada de trabalho, o salário, o direito a participação política, a organização de sindicatos e outas formas de organização civil. Se no passado, a burguesia, foi uma uma classe revolucionária contra os senhores feudais, tornou-se, na atualidade, a principal responsável pela manutenção e conservação da exploração, da ignorância e da miséria no mundo.

Conhecer a história das lutas das classes trabalhadoras e das camadas populares torna-se vital, tal qual o ar que respiramos, para então alimentarmos e inspirarmos a caminhada em busca da conquista da verdadeira emancipação humana. Assim como entender que a cada informação repassada ou movimento que as camadas privilegiadas e detentoras do capital fazem no tabuleiro da história têm a finalidade clara de provocar o esquecimento, uma espécie de amnésia coletiva direcionada, sobre o passado das lutas do povo. Assim como respirar é a importância e a necessidade de jamais esquecer às lutas do passado, pois como dizia o poeta cubano, José Martí (1853 – 1895)[14]: “um povo que não tem passado não tem futuro”, por isso tudo é feito para que a maioria da população não tenha conhecimento do passado de lutas e conquistas de nossos antepassados.


4 – Esquecer ou negar os exemplos e referenciais revolucionários
Esquecer ou negar os exemplos dos combatentes que se tornaram referenciais para a luta em defesa da dignidade humana serve aos que se sustentam com a exploração do trabalho, da natureza e da sociedade. Cotidianamente as classes abastadas e detentoras do capital, através de seus meios de comunicação, propagam e criam novos modelos para que os mais jovens e a população em geral os que tenham como referência para a vida. Os principais exemplos propagados são os que conseguem acumular riquezas e tem uma vida de sucesso, sejam artistas, desportistas, jornalistas, políticos, empresários, praticantes de filantropia e investidores financeiros, todos defensores do sistema, fazendo com que sejam criadas as condições para que esses “vitoriosos” se tornem exemplos para a população.

Para conseguir propagar esses modelos e referenciais especialistas em manipulação de mentes, estudiosos e cientistas são usados, mostrando, com seus argumentos que todos poderão um dia ser um desses que obtiveram sucesso. Existe até seita que criou os cultos da prosperidade, como se a acumulação de riquezas fosse resultado da vontade divina, de orações ou de cabeças iluminadas. Verdade que até há cabeças iluminadas entre esses escolhidos pelo sistema, mas não me recordo de alguma dessas figuras que tenham se contraposto ao modelo de sistema e ao capitalismo. As pessoas, indicadas como referenciais servem ao sistema, sustentam o modelo individualista, mesquinho e instrumentalizador das relações interpessoais, com o único fim de continuarem a fazer parte das classes abastadas, nada mais.

Por isso, preservar a memória e o exemplo de vida e dedicação dos verdadeiros referenciais daqueles que lutaram por toda a vida ao lado do povo, criando as condições para o desenvolvimento social e a construção de uma sociedade livre, justa e revolucionária é fundamental, para alimentar a utopia do comunismo, da verdadeira efetivação da dignidade humana para todas as pessoas. Além de preservar é preciso conhecer e estudar sobre a vida de Espártacos, Karl Marx, Lenin, Zumbi, Che Guevara, Nelson Mandela, Camilo Cienfuegos, Rosa Luxemburgo, Dandara, Luiz Carlos Prestes, Lampião e Maria Bonita, Carlos Mariguela, Dada e Corisco, Florestan Fernandes, João Carlos Batista, Zuzu Angel, Doroty Stang, Sandino, Zapata, Olga Benário, Camilo Torres, Salvador Allende, Fidel Castro, e muitos outros. Propagar a história desses combatentes que dedicaram as suas vidas para a construção de um mundo novo justo e solidário aos mais jovens e para todo o povo significa alimentar a indignação e a caminhada em torno da utopia.  


5 – Praticar os vícios ideológicos da burguesia[15]
Reproduzir os vícios ideológicos da burguesia é negar a luta e trair os trabalhadores e camadas populares. Para isso nunca se deve abandonar o trabalho de base, a formação política e deixar de lado a importância da organização. Sem dúvida que a história da humanidade e da luta dos trabalhadores e camadas populares mostrou ao longo da caminhada muitos erros, os quais precisam ser analisados, criticamente, para que não sejam reproduzidos. Por isso, é preciso combater os vícios ideológicos propagados pela burguesia que têm a finalidade de desorganizar, dividir, confundir e cooptar filhos do povo que atuam na luta contra o capital. Para isso não se pode reproduzir o individualismo, o personalismo, o expontaneísmo, o anarquismo, o imobilismo, o comodismo, o sectarismo ou radicalismo, o liquidacionismo e o aventureirismo.

O individualismo é a prática que sempre coloca em primeiro lugar o indivíduo, deixando a organização em segundo plano. Busca, assim, atender em primeiro lugar seus interesses privados, deixando em segundo plano sua classe ou o coletivo que diz representar.

O Personalista está sempre cuidando de seus interesses pessoais, atribuindo sempre a si o resultado das conquistas obtidas, nunca fala “nós conquistamos”, destaca sempre “eu fiz”. Ele centraliza todas as ações, não distribuindo entre os membros do coletivo, da organização.

O espontaneísta é um resistente ao planejamento do trabalho e da luta, sempre está preocupado apenas com o momento, não cumpre horário, nem data certa, atua quando tem vontade ou interesse.

O anarquista reage à organização do trabalho, não organiza as atividades e quando dirige uma reunião esta vira uma bagunça. Ele nunca reclama das coisas desorganizadas, assim preserva seus interesses particulares.

O imobilista deliberadamente não se mexe para fortalecer a organização, assim mantêm sempre em primeiro lugar seus interesses pessoais.

O comodista nunca toma posição, procura sempre estar bem com todos, sem manifestar opiniões que possam provocar críticas ou polêmicas, assim, sempre preserva seus interesses pessoais.

O sectário ou radical é aquele que deseja fazer tudo imediatamente, sem levar em conta as condições objetivas e subjetivas para a sua realização. Age assim, o sectário, por colocar em primeiro lugar aquilo que mais lhe interessa, lhe satisfaz, sem levar em conta os interesses da organização e do coletivo.

O liquidacionista é aquele que consegue provocar a divisão do grupo e da organização, criando dificuldades para a realização de atividades programadas pelo coletivo. Faz sistematicamente críticas a tudo e a todos, assim posiciona-se somente em defesa de seus interesses.

O aventureiro não atua conforme a realidade, nem mede as consequências de uma ação, costuma atuar de forma isolada e provoca a divisão no grupo, podendo provocar grandes prejuízos a organização.

O conjunto destes vícios termina por formar uma burocracia, que acaba se voltando contra o próprio povo, distanciando-se da militância e da realidade, possibilitando e enfraquecer o conjunto das lutas e da organização popular.



6 – Deixar de estudar e abandonar a disciplina
Abandonar a disciplina, o estudo e a militância revolucionária representa desconstruir a luta e a organização revolucionária. Precisamos conquistar a efetiva liberdade humana, o que dentro do capitalismo é privilégio de uma minoria, pois o conceito de liberdade, como os vícios apontados anteriormente, serve efetivamente para que se crie a ilusão de que se tem liberdade. O fato é que a luta pela liberdade tem enfrentado uma violência cruel das classes dominantes, desde a cruz usada pelos romanos, a fogueira acesa pelos cristãos, as masmorras da idade média, a morte através da tortura, a cadeira elétrica, o fuzilamento em massa até as prisões atuais. Todas essas formas de violência poucas diferenças têm, pois todas servem para intimidar, perseguir e eliminar os revolucionários e os filhos do povo que ousam combater pela liberdade e pela verdadeira dignidade humana.

Para enfrentar isso é necessário manter sempre a disciplina, pois para enfrentar o capital e sua violência, os trabalhadores e as classes populares têm somente a sua luta e organização, por isso, cumprir horários, executar as ações definidas coletivamente, contribuir com seu intelecto e materialmente, incentivar a unidade e o fortalecimento da organização tornam-se recursos indispensáveis para o enfrentamento cotidiano. Manter a disciplina não quer dizer se tornar uma pessoa triste, cabisbaixa ou chata, pelo contrário, a disciplina deve ser voluntária, espontânea e consciente, pois tem a finalidade de fortalecer a luta e organização das classes trabalhadoras e camadas populares.

Enquanto os abastados possuem recursos financeiros para contratar serviçais, forças militares e sustentar uma agressiva campanha ideológica, somente a organização e disciplina dos trabalhadores poderá enfrentá-los e criar a organização necessária para às mudanças estruturais e revolucionárias. E para essa disciplina ser consciente e voluntária é necessário que militantes da luta popular e revolucionária estudem, adquirindo cada vez mais informações e consciência de classe, o que, conforme Marx apontou, é como o cimento que da liga a uma construção e mantêm a obra de pé, sendo a consciência e consistência ideológica a substância capaz de manter a firmeza e compromisso com a luta, criando as condições objetivas para que ocorra a militância. Isto não significa trabalhar de forma voluntária, sem vínculo à organização, ou se tornar um mercenário, atuando apenas quando receber para isso.

Disciplina e militância andam juntas, estando o ativista consciente de seu papel organizador e revolucionário em qualquer circunstância, atuando em qualquer frente de lutas, seja a mobilização de massas, com lutas de rua, seja a institucional, instrumentalizando aparelhos e serviços do estado burguês para poder combatê-lo por dentro, atuando em suas próprias entranhas, ou seja, atuando na organização revolucionária, conquistando mais militantes, desenvolvendo permanentemente o estudo, a propaganda ideológica e consolidando a organização nesses tempos onde a indisciplina serve para sustentar o discurso pós-moderno, reacionário e oportunista que se propaga de todas as formas.      

  

7 – Deixar de combater as mentiras propagadas pela burguesia
Não abrir mão do combate contra as mentiras históricas, a exploração e as injustiças sociais. Atuar de forma permanente na desmistificação das mentiras propagadas pelo sistema, que usa todos os meios para manter a desinformação e alienação política da população, centrando suas ações nas classes trabalhadoras e camadas populares. Nas escolas burguesas, sustenta-se um discurso de classe, criando novos exploradores e manipuladores da história e da luta do povo, os administradores do mundo, como escreveu Adous Huxley[16]. Já nas demais escolas se desenvolve uma educação que forma pessoas acomodadas e passivas, diante da exploração capitalista, como se nada pudesse ser feito.

Como disse Che Guevara, “se você se indigna diante de uma injustiça, em qualquer parte do mundo, então somos companheiros”, por isso é fundamental preservar e alimentar cada vez mais a indignação e o combate as mentiras propagadas pelos abastados e proprietários, que têm a finalidade de preservar as injustiças existentes.

Para isso usam todas as mentiras para justificar seus crimes e práticas criminosas, que vão desde a vontade divina, a raça pura, a capacidade individual e o esforço próprio de cada indivíduo para a existência das injustiças no mundo. Combater essas mentiras é fundamental. Isso não quer dizer que não é necessário fazer uma autocrítica da experiência desenvolvida durante o stalinismo, na antiga URSS, que criou uma casta de burocratas, que reproduziu práticas burguesas e reacionárias, combateu violentamente o debate interno, chegando a eliminar velhos revolucionários que não concordavam com o que se fazia, assim abandonaram a militância e o projeto da construção da nação revolucionária pensada e implantada pelos bolcheviques e revolucionários que fizeram a revolução de outubro de 1917, dirigidos por Lenin. Mesmo assim, a experiência da URSS trouxe inúmeras conquistas e ensinamentos, que precisam ser conhecidos e estudados.

É fundamental cada grupo de trabalhadores e das camadas populares e as organizações políticas que as representam criarem e manterem seus veículos de comunicação alternativos, usarem as redes sociais, criarem páginas eletrônicas, incentivarem a formação de comunicadores populares e comunitários, criar as condições para usar os canais de televisão e rádios comunitários.

Quando for criada a Frente de Unidade de Popular, aglutinando partidos, movimentos, tendências e militantes de esquerda e revolucionários será fundamental manter um jornal diário, a nível nacional, impresso e virtual, que permita enfrentar as mentiras dos inimigos do povo. Enquanto não se constrói a unidade, cada força deve investir o que puder e no que puder para manter seus jornais, apontando as mentiras da burguesia e de seus lacaios.


8 – Abandonar o recrutamento de novos militantes
Deixar de conquistar mais pessoas para a luta. Deixar de recrutar militantes e combatentes do povo para a organização é como se sentir abatido pelas mentiras dos capitalistas. Precisamos ser milhões, conscientes e organizados para enfrentar o poderio do capital e seus serviçais, estes, quantitativamente, são em número reduzido, conseguiram influenciar as camadas intermediárias, as quais passam a ter um comportamento cada vez mais reacionário, sonhando em integrar as classes abastadas e controlar o capital.

Se a grande maioria da população vive de seu trabalho, seja na produção ou prestação de serviço, criar as condições para ampliar o número de militantes e dirigentes para a luta é uma condição fundamental para a vitória da classe trabalhadora.

Abandonar o recrutamento e a conquista de novos integrantes para a luta revolucionária tem um efeito altamente negativo, representa uma capitulação ao discurso burguês que nada pode ser feito para seguir o processo de transformação histórica da sociedade, ampliando a conquista de direitos e avançando rumo à sociedade socialista e comunista.

No passado, em condições mais adversas, muitas vezes na clandestinidade, sofrendo a perseguição policial, as organizações comunistas e revolucionárias chegaram a possuir milhares de células, com seus militantes trabalhando a formação política, desenvolvendo política de finanças, mantendo publicações diárias e assim, com regularidade, ampliando o quadro de militantes e dirigentes, formando sempre quadros capazes de dirigir e levarem em frente o ideal libertário mais nobre da humanidade.

Ao abandonar o recrutamento, ao deixar de ampliar o número de militantes e não fazer a propaganda capaz de animar e inspirar que mais e mais pessoas se somem a caminhada pela verdadeira emancipação humana, termina-se por fazer e executar justamente o planejado pelos estrategistas do capital.

Precisamos ser milhões, por isso, como escreveu Beto Guedes[17]: “um mais um é sempre mais que dois”. Recrutar é assegurar que seguiremos a caminhada gloriosa dos combatentes revolucionários que nos permitiram chegar à democracia burguesa. O dia que formos milhões efetivaremos a emancipação humana assegurando a liberdade em sua plenitude.   



9 – Considerar-se autossuficiente
O autossuficiente tem resposta para tudo, acredita que poderá com sua capacidade intelectual poderá fazer as mudanças necessárias, com isso termina por servir aos interesses dos proprietários e donos do capital, atendendo aos interesses dos abastados. O autossuficiente não procura aprender com as experiências desenvolvidas, nunca tem dúvidas, mesmo tendo conhecimento do processo histórico, não dá a atenção necessária para a avaliação e constatação dos acertos e erros vivenciados no passado. Ele sempre sabe tudo sobre todos os assuntos. Os intelectuais têm uma tendência maior a se sentirem autossuficientes, faltam-lhes humildade para debater e construir coletivamente.

Não se sentir autossuficiente para a luta e o movimento revolucionário. Pensar que ao adquirir conhecimentos acadêmicos poderá sozinho, ou somente com seu grupo como uma vanguarda iluminada e designada pelos deuses, resolver as questões gerais da sociedade e das camadas populares significa trair à luta do povo e dos trabalhadores. Construir a unidade, fortalecer a organização e a construção de movimentos de unitários e coletivos, com caráter classista e revolucionário tem o papel histórico para fazer a luta avançar.

Ao agir assim, especialmente junto às camadas populares e classes trabalhadoras o autossuficiente afasta o povo, provoca um distanciamento e desinteresse de muitos integrantes da luta do povo, que tiveram ao longo da vida a experiência em trabalhar e viver coletivamente ou em comunidades. Ter mais conhecimento acadêmico não dá o direito ao pretenso revolucionário em se sentir superior ao mais simples dos trabalhadores, pois o conhecimento prático, resultado da experiência de vida, o que muitas vezes possibilita enfrentar de maneira inovadora, mais criativa e ousada possíveis dificuldades e necessidades que a luta de classes mostra durante a caminhada.

Lenin dizia que sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário, enquanto Marx apontava a necessidade das duas andarem juntas, com o desenvolvimento de uma práxis revolucionária[18]. Ou como ensinou Paulo Freire[19], aplicando uma pedagogia libertadora, resultante da própria experiência do oprimido.     


10 – Deixar de lado as questões ambientais.
Não levar em conta a questão ambiental significa preservar o modo de produção capitalista e propagar o consumo, um dos ópios que preservam a alienação reinante na sociedade. A natureza precisa servir as gerações presente e futura, porém mantendo-se o atual modelo econômico, como pode ser visto nas mudanças e catástrofes ambientais, dificilmente isso será possível.

Ao praticar o consumo, buscando cada vez mais ter acesso aos produtos e bens apresentados pelo sistema, ocorre o aumento da degradação ambiental, sendo que o modo de vida individual deve sempre levar em conta a necessidade da satisfação das necessidades de toda a sociedade planetária.

Vivemos, todos, em um mesmo planeta, respiramos o mesmo ar, usamos a mesma água e estamos sobre a mesma terra, sendo que as fronteiras entre países nada mais são do que uma forma dos capitalistas manterem o domínio sobre partes do planeta, assim garantindo suas propriedades e consumidores.

Os Estados nacionais, mesmo tendo, até certo ponto, uma necessidade para a defesa dos ataques de países imperialistas, terminam por servir aos mesmos interesses de capitalistas, que colocam e tiram governos, conforme seus interesses.
Defender o planeta como um todo, assegurando que os mares, as florestas, as terras, as populações tradicionais, os povos indígenas, os animais e as culturas originárias sejam respeitadas deve fazer parte das ações do militante revolucionário. Isto não quer dizer que se tem que reproduzir o discurso capitalista, o qual usa a questão ambiental sempre para aumentar seus ganhos, seja com o argumento da economia verde ou da compensação ambiental, através de pagamentos para a conservação, pura e simples, de imensas regiões, deixando comunidades inteiras a mercê dos interesses daqueles grupos econômicos que pagam essas compensações ou investem na chamada economia verde. Esse discurso em nenhum momento questiona ou denuncia o modo de produção que se sustenta na exploração da mão de obra de homens e mulheres e da natureza, somente com a finalidade de assegurar o aumento da concentração de riquezas.

Uma economia sustentável deve levar em conta as verdadeiras necessidades das populações mais necessitadas, criando as condições para que a riqueza produzida possa servir aos produtores, aos verdadeiros proprietários da natureza, que não a destroem, pois necessitam preservá-la para viverem.

Defender a natureza deve fazer parte das lutas dos trabalhadores e camadas populares, sempre colocando em cheque o modelo de produção e apropriação das riquezas existentes no sistema capitalista, que cada vez mais destrói matas, rios e mares, com o único fim de acumular mais ainda riquezas. A natureza é a mãe de toda a vida, por isso cuidar dela significa defender os interesses de toda a população do planeta.

A caminho do alvorecer.
A caminhada da espécie humana tem mostrado que somos capazes de construir uma nova realidade, superar o medo, a escuridão e avançar rumo à luz e ao conhecimento. Saímos das cavernas e hoje vivenciamos a velocidade das descobertas tecnocientíficas, cada dia com mais inovações e produtos, os quais, produzidos em larga escala pelas transnacionais, têm a finalidade de influir ideologicamente para conservação do atual modelo econômico. Assim, sempre foi, desde a idade antiga, quando tudo que não interessava aos imperadores e reis, à igreja era destruído e seus autores perseguidos e marginalizados, quando não, mortos. Apesar de tudo a humanidade avançou. Avançamos na construção do conceito e no exercício dos direitos, da democracia e da liberdade.

Os conflitos sociais, entre as classes, nunca deixaram de existir, mesmo com o surgimento de inúmeros extratos sociais intermediários, cada vez de forma mais agressiva, apesar da aparente tranquilidade e paz reinante, as classes abastadas e detentoras dos meios de produção seguem controlando o poder político e militar, utilizando-os, sem nenhuma clemência, quando é preciso para defender seus interesses e a manutenção de seus privilégios. No passado, apesar de situação semelhante, as classes trabalhadoras souberam criar as condições subjetivas, elaborando e sistematizando suas lutas, organizando seus partidos e associações e combatendo para conquistar uma nova relação social, tarefa que segue presente e necessária nesse tempo de grande desesperança e descrença generalizada.

Entender que as experiências desenvolvidas pela criação da Associação Internacional dos Trabalhadores, em 1864, por Karl Marx e Friedrich Engels[20], a qual se concretizou depois com a Revolução de Outubro[21], que transformou a Rússia, um país ainda feudal, em uma nação com uma economia e sociedade superiores, foi e continua sendo fundamentais o seu estudo para entender a luta revolucionária. A organização revolucionária de operários, soldados e camponeses que criou a URSS, comandada por Lenin, possibilitou essa profunda virada na história da humanidade. Em 1924, com a morte de Lenin, assumiu o poder Josef Stalin[22], iniciando uma etapa, denunciado por Leon Trotsky[23], como a responsável pelos erros que levaram a burocratização do Estado Soviético, que culminou com a sua queda, em 1990[24]. Gorbachev[25], então, iniciou, em 1985, a implantação da perestroika e da glasnost[26], que resultou no desmantelamento do bloco conhecido como “socialismo real”. Esta experiência resistiu por 73 anos, comprovando a viabilidade da construção de uma nova sociedade, com justiça social, econômica e solidariedade, desde que os trabalhadores e as camadas populares se organizem e ousem enfrentar o desconhecido. Os erros praticados, mesmo fartamente usados pela propaganda ideológica da direita, nos permitem compreender a necessidade de refundar práticas e conceitos na luta revolucionária.

Importante ressaltar que o Brasil, após ter vivido duas décadas de ditadura civil – militar (1964 – 1985), vive a fase mais longa com democracia da história nacional, que chega a 30 (trinta) anos em 2015. Inclusive, um partido, o Partido dos Trabalhadores (PT), oriundo das lutas dos trabalhadores mantem-se no governo, em coalizão com as forças da direita e do patronato. Nestes últimos 12 anos, mesmo tendo sido consolidada uma política assistencial, que retirou mais de 10 milhões de pessoas[27] da linha da pobreza, o controle do estado permanece nas mãos dos detentores do capital, com a aplicação de uma política econômica liberal. Chama a atenção o fato de dois anos antes da posse da presidenta Dilma Roussef, em 28 de dezembro de 2014, ter sido anunciado a retirada de direitos dos trabalhadores, com a finalidade de aumentar a arrecadação de impostos para suprir um déficit orçamentário. No lugar de taxar as grandes fortunas ou ser dura com o capital, a presidente Dilma joga sobre as costas dos trabalhadores, como os capitalistas sempre fizeram, o peso das crises crônicas do capitalismo.     

Esses equívocos praticados pelo governo Lula - Dilma, o qual inclui a conivência a reprodução da velha prática da burguesia e seus serviçais, denunciado por Bertold Brecht no poema Analfabeto Político, que é a prática da corrupção, permitindo que a mídia burguesa capitaneasse uma grande mobilização, com discursos fascistas, atrasados e reacionários, em março de 2015, colocando mais de um milhão de pessoas nas ruas. Estas manifestações chegaram a questionar a democracia, com grupos defendendo a volta da ditadura, e repetindo o lema dos perdedores da eleição de outubro de 2014, apostando em um terceiro turno, pedindo o afastamento da presidente Dilma Rousseff e retomando o velho discurso anticomunista, o mesmo usado em 1964.

O momento vivido pelas classes trabalhadoras e camadas populares a nível internacional e no Brasil exige a construção de uma unidade classista, capaz de enfrentar o capital, com sua força transnacional, bem como, a nível nacional, é urgente a criação de um programa mínimo que atenda às necessidades e urgências para superar a imposição econômica e ideológica da burguesia, forjando a ampliação das conquistas sociais, econômicas e criar as condições para avançar rumo a destruição do Estado capitalista e o fortalecimento dos instrumentos organizacionais que farão avançar rumo ao comunismo.

Por isso, seguir a caminhada na construção do ideal da emancipação humana, exige que se despoje dos valores burgueses impregnados e impostos, por todos os meios, aos habitantes do planeta. É esta a proposta dos dez pontos relacionados em O que não fazer ?, pois propõe um estudo e debate que permita reconstruir e reordenar princípios e valores para as organizações dos trabalhadores e das camadas populares, seja a nível local, nas comunidades, ou estados nacionais, assim como a nível internacional, criando as condições para seguir avançando revolucionariamente rumo a conquista da verdadeira emancipação humana.

Lenin, em O que Fazer? cita Pissarev[28]: “O desacordo entre o sonho e a realidade nada tem de nocivo se, cada vez que sonha, o homem acredita seriamente em seu sonho, se observa atentamente a vida, suas observações com seus castelos no ar e, de uma forma geral, trabalha conscientemente para a realização de seu sonho”.[29]

Façamos outro mundo, somente nós, cada mulher e homem, consciente, organizado e disposto seremos capazes de fazer um novo tempo. Não vamos negar o passado, nem ter medo de fazer o futuro.

Brasília, 06 de fevereiro de 2015.




[1] Que fazer? Problemas candentes de nosso movimento. 1902. Obras escolhidas de V.I. Lenin em três tomos, volume 1. Moscou. URSS. 1960. Este livro desempenhou importante papel na luta pela criação de um partido marxista revolucionário da classe operária da Rússia
[2] Idem.
[3] http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/01/metade-da-riqueza-do-planeta-pertence-1-dos-habitantes.html
[4] Idem
[5] http://economia.terra.com.br/coca-nestle-e-mais-8-empresas-controlam-499-produtos-confira,9d5eaa9e00322410VgnVCM4000009bcceb0aRCRD.html
[6] Marx, Karl. O Capital. Crítica de economia política. 1872.
[7] Lenin. O imperialismo, fase superior do capitalismo. 1917. http://pcb.org.br/portal/docs/oimperialismo.pdf
[8] Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels. 1848
[9] http://www.infoescola.com/biografias/berthold-brecht/
[10] História da Riqueza do Homem. Leo Huberman. ZAHAR EDITORES. Ano: 1981. 
[11] Manifesto Comunista, de Karl Marx e Friedrich Engels. 1848.

[12] Materialismo Histórico e Materialismo Dialético. Louis Althusser. Editora Global

[13] Spartacus foi um ex-escravo que liderou cerca de 90 mil homens, também ex-escravos, em uma revolta que quase levou o império romano a um colapso político e econômico. Spartacus lutava pela liberdade e pelo término das sessões de horror, nas quais os escravos eram submetidos a espetáculos nas arenas. Sua liderança foi inegável e por muitos ele é chamado de herói.
[14] Apóstolo e herói nacional, pai espiritual da Revolução Cubana, José Martí é considerado um dos maiores pensadores latino-americanos do século XIX. http://operamundi.uol.com.br/conteudo/opiniao/37770/50+verdades+sobre+jose+marti.shtml
[15] Teoria da Organização, de Clodomir Santos de Moraes. http://www.cecac.org.br/Coluna/Clodomir.htm
[16] Admirável Mundo Novo. Huxley, Aldous. 1932.
[17] Sal da Terra, de Beto Guedes.
[18] Valores de uma práxis militantes, Caderno de Formação nº 37: “Valores de uma práxis militante”, é
uma publicação do Setor de Formação - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra  http://www.reformaagrariaemdados.org.br/sites/default/files/Caderno%20de%20Forma%C3%A7%C3%A3o%20%20-%20Valores%20de%20uma%20pr%C3%A1xis%20militante%2015out09.pdf
[19] Pedagogia do oprimido, de Paulo Freire. 1968.
[20] http://www.mundoeducacao.com/historiageral/associacao-internacional-dos-trabalhadores-ait.htm
[21] http://www.portalbrasil.net/historiageral_revolucaorussa.htm
[22] http://comunidadestalin.blogspot.com.br/p/obras-de-stalin.html
[23] http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=350
[24] http://www.brasilescola.com/historiag/urss.htm
[25] http://www.infoescola.com/uniao-sovietica/perestroika/
[26] http://www.brasilescola.com/sociologia/perestroika-glasnost-as-reformas-urss-que-iniciaram-uma-nova.htm
[27] http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/06/1469015-segundo-ipea-dilma-inflou-dado-sobre-diminuicao-da-miseria.shtml
[28] http://russiapedia.rt.com/prominent-russians/literature/dmitry-pisarev/
[29] V. I. Lênin. Que Fazer? Hucitec. SP. 1986. p.133.

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