MOVIMENTO DOS PESCADORES E PESCADORAS ARTESANAIS A LUTA DOS “SEM MAR” PELO TERRITORIO PESQUEIRO

Assim como os povos indígenas e os quilombolas, assim como os agricultores familiares dps assentamentos, os pescadores e pescadoras artesanais estão em luta pela regularização dos seus territórios de uso coletivo, os lugares onde moram, trabalham, costuram suas redes, amarram suas canoas, abrangendo espaços terrestres e dos rios, lagos, lagoas e mar para evitar ser expulsos por resorts de luxo, açudes e barragens, aqüicultura em grande escala, carcinicultura, exploração do petróleo, mineração e monoculturas, que ameaçam transformar aos pescadores em “sem mar”.

Com o lema “Biodiversidade, Cultura e Soberania Alimentar do Povo Brasileiro”, o Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais da Bahia (MOPEBA) e do Brasil lembra que a pesca artesanal tem garantido a segurança alimentar e nutricional de milhares de comunidades pesqueiras, estimando-se que quase 70 % do total do pescado produzido no pais procede da pesca artesanal.

Uns dois mil pescadores e pescadoras artesanais representantes de 16 estados do Brasil acamparam durante três dias em Brasília e manifestaram nas ruas da capital no lançamento da Campanha pelo Território Pesqueiro cujo principal objetivo e a aprovação pelo Congresso Nacional de uma lei de iniciativa popular que regulamente os direitos territoriais das comunidades pesqueiras tradicionais.

“Não obstante a importância econômica, social e cultural da pesca artesanal, observamos que o Estado brasileiro sempre desconsiderou a sua importância e atualmente desenvolve uma serie de políticas desenvolvimentistas, favorecendo o avanço dos grandes projetos econômicos sobre os territórios tradicionalmente utilizados pelas comunidades pesqueiras”, sinaliza o documento do Movimento. O MPP (Movimento dos Pescadores e Pescadoras) denuncia que o modelo de desenvolvimento econômico adotado pelo Estado “vem ameaçando a existência dos territórios pesqueiros e consequentemente o patrimônio cultural dos pescadores e pescadoras artesanais”.

Esta situação “se intensifica e agrava na medida em que o governo, sob pressão dos empresários e latifundiários, busca flexibilizar a legislação ambiental, a fim de favorecer a expansão do agro e hidronegocio inclusive nas áreas de preservação permanente, manguezais e matas ciliares, bem como em unidades de conservação (RESEX e RDS)”.

A Campanha, organizada pelo Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil, precisa a assinatura de 1% do eleitorado do pais- 1.385.000 assinaturas- e está embasada na Constituição Federal de 1988, na lei federal 9985 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação) e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, no qual o Brasil é signatário, que considera que as comunidades tradicionais possuem direito sobre seus territórios.

O lançamento da Campanha aconteceu entre os dias 4 e 6 de junho no Pavilhão de Exposições do Parque da Cidade, onde pescadoras e pescadores e militantes afins a causa se envolveram em atividades como plenárias, eventos culturais, discussão do projeto de lei de iniciativa popular, passeata e grupos de discussões.

Os pescadores do Estado da Bahia integraram a maior delegação do evento, com representantes do Recôncavo, Norte, Sul e Extremo Sul, sendo a caravana desta ultima região composta por militantes de Canavieiras, Itapebi, Cabrália e Guaiú.

Para alem das atividades planejadas pelos organizadores do evento, os integrantes do Extremo Sul baiano participaram na ocupação do prédio da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em protesto contra as violações desses direitos fundamentais que vem sofrendo a comunidade do Quilombo Rio dos Macacos, da Bahia, por parte da Marinha do Brasil.

O espírito da lei de iniciativa popular se baseia em que, por lei, as comunidades de pescadores artesanais, por ser uma comunidade tradicional (tal como os povos indígenas) tem direito ao território onde mora e trabalha como única maneira de preservar os seus saberes e fazeres, e continuar a transmiti-los as futuras gerações. Entretanto, as comunidades pesqueiras vêm sendo expulsas dos seus territórios – beira de praias, manguezais, ilhas, zonas ribeirinhas, lagos e lagoas e até do mar- e, a diferença dos povos indígenas e quilombolas, não possuem instrumentos jurídicos concretos para a delimitação, demarcação e titulação do território pesqueiro.

O direito de permanência nos territórios tradicionais pesqueiros são negados e estes são considerados espaços vazios, que tem sido tomados pelos grandes empreendimentos empresariais, latifúndios, especuladores de terras, turismo empresarial, implantação de parques aquicolas, construção de resorts e campos de golfe, grandes barragens e outros.

Esta expulsão do território e bem evidente na nossa região, onde vemos que pela especulação imobiliária os pescadores, pescadoras e marisqueiras foram empurrados fora da beira do mar, rios e mangues e hoje muitos moram em bairros afastados dos seus locais tradicionais de trabalho, como o Bairro Esperança em Sana Cruz Cabrália e o Baianao em Porto Seguro, tendo que se deslocar grandes distancia até as praias. O MPP considera que o direito ao território é questão prioritária e necessária para a manutenção dos saberes tradicionais do pescador e da pescadora, não somente como produtores do 70 por cento do peixe consumido no Brasil, senão também como guardiães dos bens naturais do pais e representantes insubstituíveis de tradições ancestrais que formam parte da sócio-biodiversidade brasileira.

Entre a aquicultura a grande escala, a privatização das águas, e as cercas em praias, manguezais, beiras de rios e lagoas, os pescadores artesanais e marisqueiras são uma raça em perigo de extinção, e com eles iriam embora segredos ancestrais de nos e costuras, confecção de manzuas e outros aparelhos de arte e produção, cantigas, canoas e saveiros.

Hoje estão em luta pelos seus territórios tradicionais, e assim cantaram marchando pelas ruas de Brasília: “Vamos juntos engrandecer/ nosso jeito de viver/ Com território preservado/ nosso pescado é pra valer/ Agora resta se organizar/ para impedir a degradação/ Queremos liberdade, justiça, garra, determinação/ Da pesca artesanal ecoa um grito no ar/ POR TERRITORIO PESQUEIRO PARA VIVER E TRABALHAR”.

Texto: Patricia Grinberg- jornalista

Informe desde Brasília: prof. Jean do Guaiu

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